Charles Feeney. Morreu o ‘James Bond da filantropia’

1931-2023  Escolheu viver uma vida modesta

Este não se ficou pela pregação aos peixes, nem ensaiou nenhuma forma de proselitismo ou de ostentação das suas virtudes morais, mas soube ser o mais discretamente enfático ao doar uma fortuna de milhares de milhões, tendo optado por viver uma vida mais modesta. Charles F. Feeney, um pioneiro das lojas duty-free e um investidor astuto em start-ups tecnológicas, colheu os frutos do seu trabalho e, até aos 52 anos, desforrou-se das suas origens humildes, vivendo uma vida de luxo. Mas, tendo nascido no seio de uma família irlandesa que vivia em Nova Jérsia, nos EUA, como recordou o The New York Times, a partir de certa altura, não conseguia conciliar a fortuna e ostentação com os valores que recebera na infância, sendo filho de uma enfermeira e de um operador de seguros, nascido em Elizabeth, e que não queria desligar-se dos vizinhos e amigos da infância. Se gozou à grande e provou todas as iguarias e luxos desses paraísos que fazem de tantos homens monstros de indiferença,  depois de ter explorado o horizonte dos multimilionários, comprando casas nos lugares mais exclusivos, fosse em Nova Iorque, Londres ou Paris, refúgios espantosos em Honolulu ou na Riviera Francesa, frequentando as melhores festas com a nata da nata, enjoou. Decidiu mudar de vida, e fê-lo sem trocar um tipo de ostentação e vícios de ordem económica pelos de natureza moral. Doou quase toda a sua fortuna de 8 mil milhões de dólares a instituições de caridade, e vivia desde há muito num modesto apartamento arrendado, em São Francisco. A sua morte foi anunciada pela Atlantic Philanthropies, um grupo de fundações que criou e financiou desde o início dos anos 1980. Em dezembro de 2016, com a doação de 7 milhões de dólares à sua alma mater, a Universidade de Cornell, para o trabalho de serviço comunitário dos estudantes, Feeney esvaziou oficialmente as contas da Atlantic Philanthropies. Guardou apenas 2 milhões de dólares para o que chamou de provisões decentes, de modo a garantir que os seus cinco filhos adultos tinham uma boa almofada, e tudo o resto que acumulou ao longo de seis décadas de negócios, acabou por ser posto à disposição de uma série de causas e instituições de beneficiência em vários países, sendo que Feeney tudo fez para esconder a sua identidade, riqueza e filantropia. Por essa razão, foi apelidado pela revista Forbes de ‘James Bond da filantropia’.