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Charles Feeney (Foto: reprodução)

Charles Feeney (Foto: reprodução)

Há cinco anos, o bilionário Charles F. Feeney sentou em uma confortável poltrona em seu apartamento, no leste de Manhattan, e prometeu que, até o final de 2016, iria doar toda a fortuna que havia conquistado em sua vida. Feeney chegou a ter um patrimônio estimado em US$ 8 bilhões, montante que foi doando ao longo da vida. Jogar esse dinheiro ao léu, sem critérios, ou fazer doações incoerentes não é do perfil de Feeney. Há 30 anos, ele fundou a Atlantic Philanthropies e a tornou uma das maiores fundações privadas do mundo. 

Ele acaba de decidir doar, por meio da Atlantic, mais US$ 7 milhões a Cornell University, para apoiar estudantes que realizam serviços ou trabalhos comunitários. Com esta doação, Feeney termina de se desfazer de  praticamente toda sua fortuna, totalizando US$ 8 bilhões doados ao longo de 35 anos para apoiar causas em educação, saúde pública, direitos humanos e ciência. "Você fica muito nervoso em lidar com tanto dinheiro, mas nós fizemos um bom trabalho", disse Feeney,aos 85 anos, durante entrevista ao The New York Times. Ele ficou com uma fortuna avaliada em "apenas" US$ 2 milhões — uma quantia modesta para quem já teve que lidar com bilhões e bilhões. Ele e sua mulher, Helga, agora vivem em um apartamento alugado em São Francisco.

Nascido em Elizabeth, na Carolina do Norte, Feeney serviu como operador de rádio das Forças Armadas até entrar na Cornell University. Em 1950, reencontrou um colega de faculdade, Robert Warren Miller, e juntos eles tiveram a ideia de começar a vender produtos livre de impostos para viajantes. Começaram com perfumes, fitas de gravação e rádios. Expandiriam depois para aguardente e tabaco nos aeroportos. Era uma época na qual o conceito de "lojas duty-free" - onde produtos são vendidos a viajantes livre de impostos - ainda estava só começando e eles acabaram por fundar o Duty Free Shoppers Group (DFS Group). 

O grupo iniciou operações em Hong Kong, expandiu para Europa e depois outros continentes até crescer e se tornar a gigante global do varejo com lojas duty-free em todo o mundo. O que, obviamente, fez Feeney e seus sócios muito ricos. Mas ele transferiria todas as suas ações da empresa (38,75%) para uma fundação de caridade. Em 1997, ele decidiu deixar o grupo e articulou uma venda da DFS para a Grupo LVMH, dono da Louis Vuitton. Ao longo das últimas décadas, ele atuou como investidor de startups e defensor de diversas causas não só no mundo dos negócios — mas também humanitárias. Por muito tempo, sua ligação com fundações de caridade e com a Atlantic Philanthropies foi mantida em sigilo.

"Jeito" Feeney

O ex-bilionário é conhecido pelo desapego total aos bens. Até os 75 anos, Feeney viajava carregando uma mochila de plástico. Por muitos anos, quando vivia em Nova York, ele não almoçava nos restaurantes de luxo, ao contrário, comia em hambúrgueres caseiros em um local simples na East 57th Street. Também sempre preferiu usar um relógio de US$ 10. Ele começou a doar sua fortuna e a se tornar um dos maiores filantropos americanos em 1982. Mas fez grande parte disso em silêncio — o que o fez receber da Forbes, revista americana famosa por divulgar seu índice dos bilionários nos mundos, a alcunha de "James Bond da filantropia". Seu nome não apareceu em cartas com letras douradas e em nenhum dos 1 mil prédios, localizados nos cinco continentes do planeta, que receberam US$ 2,7 bilhões de seu dinheiro em doações. Por anos, o apoio da Atlantic veio com a condição de que os beneficiários não divulgassem o nome do doador. 

A motivação para a discrição "era também uma maneira de alavancar mais doações — já que algum outro indivíduo poderia contribuir e ganhar o prestígio pela nomeação", disse Christopher G. Oechsli, presidente e diretor-executivo da Atlantic.

Durante os anos 90, Feeney encontrou-se secretamente com forças paramilitares de Belfast, na Irlanda do Norte, para pedir que elas largassem a forma de guerrilha de atuar. Prometeu suporte financeiro, caso o grupo optasse por seguir sua luta por meios políticos. A Atlantic também ajudou a criar o sistema de saúde público do Vietnã e financiou retrovirais para tratamento da AIDS na África.  As últimas rodadas de doação, cerca de US$ 600 milhões, incluíram o apoio aos "companheiros do Atlântico", jovens líderes de países emergentes que trabalham para criar sociedades mais saudáveis ​​e com menos desigualdade. Feeney é considerado um "herói" pelo megainvestidor e também filantropista Warren Buffett. 

A matéria do The New York Times também compara o estilo de Feeney com o do também bilionário e futuro presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. "Eles são o oposto um do outro. Por anos, Trump se vangloriou de estar nas listas dos mais ricos do mundo, enquanto Feeney tentou ao máximo manter-se fora delas. Grande parte do dinheiro da Atlantic veio da própria fortuna pessoal de Feeney, enquanto o da Fundação de Trump veio, principalmente nos últimos anos, de terceiros", afirma a matéria . "Eu não estou aqui falando o que as pessoas devem fazer com seu dinheiro, mas acho que há uma obrigação de olhar ao redor e ver como é possível ajudar os outros", disse Feeney em vídeo publicado pela Atlantic Philantropies